sábado, 27 de junho de 2009

O Lopes

O Lopes é um dos nossos encarregados em obra. Ou, pelo menos, aspirante a tal. E é uma figura toda ela singular. Em termos de fisionomia, só para vos enquadrar, diria que é uma mistura de Kramer (da famosa série Seinfeld) com o António Feio (o das conversas da treta).

Lembro-me que uma das primeiras coisas que me disse, quando o conheci, foi que estava a aprender Quimbundo.

- Assim é mais fácil comunicar com esta gente. Eu como tenho facilidade em línguas, já falo 5, vou dedicar-me a isso.

- Mas Lopes, pelo que me parece todos eles falam Português. Para quê o Quimbundo?

- É para ralhar. Eu ralho com eles em Quimbundo que tem mais impacto. Estes gajos são umas doninhas, fingem que não percebem Português. Aí saio-me com duas larachas em Quimbundo que eles até abanam!

Logo aqui percebi que o Lopes seria uma surpresa diária. E tentei imaginá-lo a dar reprimendas em Quimbundo, o que motivou em mim uma gargalhada interior.

Ao fim do primeiro dia de trabalho já ele tinha uma lista de três folhas A4 com necessidades para a obra. Entre elas, dois frigoríficos (um grande e um pequeno, ora pois) e outras tantas coisas supérfluas que lhe foram vetadas.

- Lopes, não andamos aqui para perder dinheiro. A obra no fim tem que dar lucro, não podemos gastar em coisas que não façam realmente falta.

- Eu percebo engenheiro, mas às vezes ocorrem-me necessidades e eu peço logo. Só depois dou comigo a pensar: "ó Lopes, tem mas é juízo!"

É mais uma particularidade do artista. Fala várias vezes na terceira pessoa. Há dias, perdeu a sua fita métrica e era vê-lo pela obra a gritar com os serventes:

- Vamos lá, todos à procura da fita do Lopes. O Lopes tem coisas para medir e precisa da fita!

É realmente um mamífero sui generis o "nosso" Lopes.

Hoje:

- Ó Engenheiro, chegue lá aqui.

- Diga Lopes.

- Olhe, tenho uma lembrança no meu telefone a tocar, veja. Sabe o que é?

- Não, o que se passa?

- É o Lopes que faz anos hoje. Veja lá que nem me lembrava, não fosse isto tocar e não dava por nada. Quarenta e um aninhos aqui no menino!

- Pelo menos lembrou-se de quantos faz. Parabéns!

Apertei-lhe a mão e fui-me embora a pensar no que ainda terei que ouvir até ao fim da obra. Sacana do Lopes! É bom homem, mas tem cada uma...

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